Comparar o fenómeno Violleta com a recente manifestação
popular a favor da libertação de José Sócrates não lembraria a ninguém, mas,
dado a proximidade dos dois acontecimentos há que refletir em conjunto estes dois
fenómenos sociais. A surpresa é, feita uma análise mais atenta, a similitude
entre ambos.
Numa primeira abordagem, diria que Violetta e Sócrates são
ambos causadores de fortes diarreias de fanatismo popular, irracional e
puramente “porque sim”. É como ser-se de um clube de futebol, não há
argumentos, nem são precisos. Tanto a personagem da Disney como o ex-primeiro
ministro têm perfis de autênticas estrelas Pop que arrastam multidões e comovem
corações.
Violetta (Martina Stoessel) é uma adolescente musicalmente
talentosa que retorna a Buenos Aires, sua cidade natal, onde descobre amizades e
sua vocação pela música, após passar uma temporada na Europa. A série de
televisão argentina bateu recordes de audiência e deu origem à banda
"Violetta", formada por integrantes do elenco.
Conheço pessoas que ficaram na fila da FNAC 8 horas para
comprarem bilhete para o espetáculo da Violleta Live. Foram 72 mil bilhetes
vendidos para as seis sessões da megaprodução que trouxe a Portugal grande
parte dos personagens da série do Disney Channel ao palco.
A histeria das pré-adolescentes até se compreende, é própria
da idade em que se vibra com aquilo que faz mover o grupo a que se quer à força
pertencer. Mas, o que dizer das próprias mães que aceitaram gastar largas
centenas de euros num concerto, entre preço do bilhete, deslocações e
alimentação. Levaram as filhas, as filhas das amigas e as amigas das filhas,
vindas de Norte a Sul do país. Levantaram-se às seis da manhã para virem num
comboio lotado ao concerto a Lisboa. E a avaliar pelos relatos nos órgãos de
comunicação também choraram “ de emoção” junto com as filhas. Venderam-se
bilhetes de 500 euros só para tirar uma foto com a Violleta, para além de
assistirem ao concerto mais perto do palco. A potente máquina de marketing por
detrás da Violleta é dirigida sobretudo aos pais que não lhe conseguem
resistir.
Já o fenómeno José Sócrates é tão surreal como o de Violetta,
mas, muito mais perigoso e igualmente assistido por uma bem oleada máquina de
modernas ações de marketing. O alvo? O povo castigado, facilmente coagido e com
um elevado grau de irracionalidade, por isso mais maleável que barro morno.
Um bom exemplo disso foi, pois, o recente ajuntamento
popular que contou com cerca de 100 manifestantes da região da Covilhã que
chegaram em duas camionetas e concentraram-se este domingo em frente à cadeia
de Évora para participarem numa ação solidária para com o ex-primeiro-ministro.
Já não são só os discursos dos taxistas a favor de Sócrates, nem as opiniões de
café misturadas com uma imperial e sandes de courato que elegem o indiciado de
crimes que lesaram o povo português a melhor primeiro-ministro depois do 25 de
Abril (os mesmos que elegeram Salazar a figura do século).
Indiciado por fraude fiscal qualificada, corrupção e
branqueamento de capitais, ainda assim Sócrates é alvo de carinhoso apoio de
populares. Não só são os amigos políticos, aqueles a quem Sócrates “pagou”
favores e nomeações, nem membros da família socialista… são pessoas comuns, gente
humilde (e as maiores vitimas dos governos Sócrates) vindos de propósito da
Covilhã para entoarem o lema “Sócrates amigo a Covilhã está contigo” e depositarem
cravos e rosas junto à porta da prisão.
Assim se pariu um mártir das malhas da (má) justiça, a
defesa de Sócrates está a fazer-se na rua.
Estes dois fenómenos Violetta e Sócrates dispõem ambos de
poderosas máquinas dirigidas à emotividade e às fraquezas das pessoas (adultas)
que não resistem aos seus apelos. As multidões são acéfalas e especialmente sensíveis
ao apelo da heroicizarão (no caso de Violleta) e da martirização (no caso de
Sócrates).
A má consciência de que não somos tão bons pais como desejaríamos
face às exigências pessoais e de carreira podem justificar a machadada no orçamento
de muitas famílias que se viram na audiência esgotadíssima dos concertos de
Violleta. O que já não é assim tão facilmente explicável é a histeria coletiva
que contagiou também as mães e que as levou a comprarem às filhas o visual
integral “Violleta” e que estou certa de que só o pudor impediu as ditas mães de
envergaram os modelitos acaso os houvesse em tamanhos L ou XL.
Já no caso de apoio a José Sócrates que em muito contribuiu
para o afundanço do país e as sucessivas receitas de austeridade que lançou
ainda mais para a pobreza as pessoas que agora se viram na manifestação de
Évora, as coisas não se explicam por más consciências. Mas, talvez as T-shirts
envergadas pelos manifestantes nos digam muita coisa sobre o assunto que melhor
do que ninguém a ciência do marketing pode explicar!
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