Thursday, March 28, 2013

FRIDAY'S CHRONICLE: FASHION IS MY FREE WORLD


Jak and Jil


Vivi poucos anos sob o regime de restrição das liberdades fundamentais que assolaram o país décadas e o afundaram nesse obscuro cinzentismo dos embustes da cultura das procissões e romarias. Era demasiado nova ( tinha 8 anos quando se deu a revolução) para recordar com clareza esses tempos de censura e medo que geravam a auto-censura que era bem mais castradora para as condições necessárias à criatividade que a própria censura. A moda portuguesa nesse tempo não existia, e creio mesmo que nem sequer existia a ideia de moda, a não ser aquela que abundava nas revistas de louvores femininos e nas Burdas importadas com moldes de vestidos inspirados na chique moda parasiense. Nesse tempo a moda era hiper-elitista e o fashion world era um mundo fechado e inacessível num absolutismo baseado na ideia de que o luxo era exclusivo de uns poucos eleitos que nunca se misturavam com o comum dos mortais.  

Felizmente, que as coisas mudaram, o sistema politico por um lado, e ainda que mais lentamente, a própria ideia de moda que com a internet e o conceito de aldeia global, desceu à rua - como a revolução - e se democratizou para o bem e para o mal. Para o bem porque hoje a moda está acessível a um largo espectro de pessoas e qualquer um que tenha a moda como paixão pode entrar pela porta grande do fashion world com a facilidade que os meios tecnológicos permitem, ou seja, é também, agora, a moda a entrar pelas janelas virtuais das pessoas. Para o mal porque a pressão que se exerce sob os designers e diretores criativos das grandes marcas é enorme, fruto da necessidade de se criar coisas novas a cada 3 meses que rapidamente se tornam velhas mal chegam ao computador do seu público e se difundem nas redes sociais. Por outro temos a presença da fast fashion que as fashion victims idolatram e que muitos vêm como ameaça à verdadeira moda que nada tem de slow actualmente. 

Para mim a moda é a expressão máxima da liberdade. Claro que isto não passa de um ideal porque hoje em dia a moda está sujeita a inúmeros constrangimentos de mercado e de um público sedento de novas tendências e a exigir mais quantidade que nem sempre é sinónimo de qualidade. Mas, continuo a achar que a moda é a liberdade quase absoluta de dispor da nossa imagem que é o último reduto da soberania pessoal. Não é por acaso que uma pessoa quando restringida da sua liberdade individual e vai para a prisão é impedida de usar a sua roupa e de determinar a sua própria imagem. A moda é não só o espelho da identidade de uma época, de uma geração, como o simbolo vivo e mutável da contemporaneidade. Pode escrever-se a História da Humanidade só através da história da sua roupa, acessórios e demais objetos de uso quotidiano de embelezamento pessoal. A farda é oposto da moda, é a uniformização e o esbatimento da individualidade em prol de uma ideia de colectivo.

O que eu mais adoro nesta ideia romântica de moda é justamente a capacidade ilimitada de nos auto-determinarmos como seres individuais e que é exclusivo do Homem. Mesmo as fashion victims, em particular, e os fashionistas, em geral, que perseguem em cada estação as tendências ditadas por meia dúzia de marcas e designers que todos querem e desejam usar, mesmo assim, por mais globalizada que a moda esteja, ela é uma resistente porquanto cada tendência se esbate e se modifica de acordo com a personalidade de quem a usa. Mesmo quem imita na perfeição os manequins de montra e copia o que vê nos editoriais de moda, tem sempre aquele "je ne sais quoi" que o distingue dos demais. Esta é a prova de que ninguém consegue copiar o estilo do outro, antes o assimila como seu e nessa sublimação já não é exactamente igual, mesmo naquelas pessoas mais desprovidas de imaginação. Por isso a moda não é só aparência e não trata só do aspecto exterior. A moda nasce do interior das pessoas, da sua liberdade de se auto-determinarem, mesmo quando se diz não gostar de moda e nada ter a ver com moda. Porque a moda é prévia à consciência do que seja a moda. As crianças desde tenra idade já dão a sua opinião sobre o que gostam e não gostam de vestir e já têm as suas preferências estéticas.

Por outro lado, a moda é o acto mais social que existe. Sem sociedade a moda não teria razão de existir. A moda também é o conjunto de códigos mais ou menos intrincados que cada sociedade se apropria para se distinguir das outras e exercer a sua originalidade coletiva. Quanto mais definidos forem esses códigos mais rigida é a sociedade e, pelo contrário, quanto mais permissivos forem mais respeito há pela autonomia e liberdade pessoal. Uma sociedade é tanto mais evoluida quanto consegue, sem perder a sua autoridade e identidade coletiva, dar o máximo de liberdade ao ser individual. A moda é esse espaço de liberdade, indivudual e social.

Claro que, como atrás referi, nem tudo são rosas no fashion world e hoje mais do que nunca se discute a falta de qualidade da criatividade motivada em parte pelas pressões de mercado de retalho que se vêm a braços com uma crise económica, com a ameaça da fast fashion que copia descaradamente as marcas de luxo e com a velocidade que ultrapassa a barreira do som com que as criações dos designers se tornam velhas após a sua dissiminação viral nas redes sociais e blogs mesmo antes de chegarem às lojas. Quem é que ainda suporta a tendência do padrão de riscas a preto e branco quando a primavera só chegou há dias? E aquela saia-calção minimal da Zara em branco que já se tornou mais viral que o Harlem Shake no youtube?

Todavia, e apesar de todos esses constrangimentos a moda ainda é a minha paixão e o meu espaço de liberdade individual. Todos os dias de manhã quando decido o que vou vestir estou a exercer no seu máximo a liberdade de criar e gerir a minha imagem e a forma como vou comunicar com os outros que é como quem diz, a maneira como me sinto nesse dia ou como quero que os outros me vejam. E felizmente, hoje a moda tem um espaço de liberdade tamanho do mundo, ou quem sabe, maior que o universo porque tão infinito quanto a imaginação livre e porque não, rebelde.

     

No comments:

Post a Comment